quinta-feira, março 31, 2005

Now...Now I have to sleep...

Da Fome a Vontade de Comer

domingo, março 27, 2005

Da Noite

Pululo com paciências sorumbáticas por aí e sinto sinto tudo tudo cá dentro só de assimilar um som um som sistemático e não é por ninguém nego nego tudo e volto a negar se for necessário sinto uma fome só isso uma fome que não me persegue sou eu que a devoro sou eu que a agarro dentro das entranhas já devoradas por outras fomes as minhas que devoram a fome e que já foram devoradas por outras fomes as entranhas que me são encaloradas pelo frio da rua e pela chuva sensível que se abate sobre o meu corpo sem ter consciência sem saber que se esbate na pele dos corpos que não se defendem dela e também não não tenho receios infundados de andar por aí só aprecio e também não deixo de amar as pessoas gosto é de ir por aí mais um livro e eu mais previsíveis é verdade mas não deixa de ser música e literatura um livro e eu duas companhias que se intercalam simultaneamente e que esbatem na ausência de contornos conforme a chuva cai conforme o tempo se faz mais escuro e conforme o coração das vontades se ilumina na solidão da noite

sábado, março 26, 2005

O pão

Um dia o pai teve de fazer um pão. Agarrou na farinha e na água e nos ovos. Amassou. Amassou com mais força. Bebeu um trago de vinho da adega. Amassou mais ainda. Sal. Já ía esquecer-se do Sal. Uma mão cheia dele. Amassou. Foi à adega buscar mais vinho. A filha pergunta ao pai se já tinha posto o sal na massa do pão. O pai responde que não. O vinho levava ao esquecimento. A filha mete mais sal. Amassa mais. Deixa a massa de descanso. Sai. A mãe entra na cozinha. Estava doente. Tinha de estar na cama. Mas acordou atormentada. O sal. Não se esqueçam do sal. Olha para a massa. De certeza que não puseram sal ainda. Repete os mesmos gestos. Sal e amassa. Vai para a cama. Cansada. O pai volta. A massa no forno. Ninguém come o pão.

Eu + Ou = U?

Eu-topia e Ou-topia
"Eu" de sítio bom
"Ou" de Nenhum lugar

U-topia
"U" de em lugar nenhum existe um sítio bom?

terça-feira, março 22, 2005

Receita para...

Receita para ser feliz não pensar não pensar em nada nada soh em nada se deve pensar para se ser feliz na vida ter tudo o que os outros pensam que se deve ter para se ser feliz problema questionar tudo não dormir passar noites insónias não dormir e pensar em barbaridades mesquinhas surrealistas e lá ando a pensar em porcarias outra vez e já vai em que vez esta noite a terceira mas porque é que não penso em sexo ou noutra cena mais normal e anda tudo a pressionar não penses age mais não sejas assim porque é que és assim não penses faz só consegues vencer se agires mas mas o mas não existe não penses em nada é desnecessário segue a receita a receita do não pensar obrigado pelo conselho vou tentar seguir e algum segredo algum segredo como algum segredo para conseguir um resultado delicioso como esse de o ser feliz o único segredo é não seres tu próprio e não pensar nisso sê o que os outros querem que tu sejas ponto

terça-feira, março 15, 2005

Sugestão manipulativa

Um relógio que marca as dez para as duas (ou as dez e dez) provoca no nosso cérebro a imagem do sorriso desconcertante e, na vontade, a obtenção daquele objecto para o qual o sorriso é dirigido.
Os volteios das compras começam. E apenas devido a uma imagem, o instinto do poder ter é inscrito nos gestos. A imagem sugestiva. A sugestão manipulativa.

Quando todos os relógios da publicidade marcam as 10 para as duas (ou as 10 e 10) a alma sente revigorar o desejo do querer mais.

segunda-feira, março 14, 2005

Conheces a Vergonha?

Todos os brilharetes que eram elaborados por ela provocaram as risadas sarcásticas dele e só dele só ele não a respeitava e isso era um desgosto apenas hipostasiado pelo nível de loucura provocada pelo desprezo dele e só dele era procurado por ela o respeito e isso ele não sabia dar e isso era imperativo na vida dela e ela vestia-se só ela de palhaça para ele continuar a desprezá-la mas não ele ria-se com aquela verdadeira intromissão de quem olha para um animal com desprezo porque nem era essa a ideia porque ele olhava para ela com sensibilidades dúbias de atracção e de gozo de quem pretende envergonhar outrem e ela inverteu isso e ela voltou a arranjar homem que também a soubesse apreciá-la da mesma forma e ficou satisfeita porque ele o primeiro homem já não tinha ninguém insuportável na vida dele de quem podia rir-se de quem podia desprezar de quem podia sentir-se como um ser ligeiramente superior a ela que lhe dedicava com ternura aquelas atrocidades gestuais ligeiramente envergonhadas porque eram só para ele e mais ninguém tinha interesse em ver uma outra pessoa torturar-se a si própria daquela forma.

quarta-feira, março 09, 2005

A Hora do Lobo

Eram três vezes uma hora dentro de uma madrugada bem entrada. Era a hora do lobo e, como todos sabiam, era a hora em que os espíritos desciam sobre aquela que havia sido a antiga morada e por onde todos tinham passado e, nessa altura, escolhiam quem iria ser o próximo futuro apenas espírito...e apenas espírito porque até então era carne e espírito e depois passaria a ser como um deles.
Naquela hora escolheram então três irmãos. Os únicos rapazes de uma família de 14 dos quais já tinham sido transformados em espíritos metade deles e, agora os invisíveis queriam trazer consigo três dos sete que restavam... todos à mesma hora... mas que estaríam em sítios diferentes por força das circunstâncias das próprias vidas, uma de cada um.
Assim, fizeram um plano tridimensional conforme o espaço que dividia a Terra em terços, conforme os sítios onde se encontravam.
Um ía caminhando para se aproximar de uma fonte para encher o cântaro para matar a sede dos lá de casa, pois cachopo como era não tinha outra obrigação. Outro estava na guerra do Ultramar preparando-se uma vez mais para cumprir o dever que lhe fora incumbido, o dever supremo de proteger o seu país e, se tivesse de ser, teria até de morrer pela pátria, diziam-lhe embora sem muita convicção (pois cada um tinha os seus pensamentos e as suas próprias ideias sobre o sentido da guerra que não era a deles). Um último lembrava-se de ir nadar porque gostava sempre de ir orgulhando-se de ser o melhor de entre os moços que as aldeias perto da sua e que a sua onde tinha crescido ainda resguardavam.
Apenas as três irmãs parcas intercederam pelos três irmãos. Mas os espíritos pediam por um novo companheiro e as parcas é que teriam essa tarefa de escolher o fio de vida de entre os três que iriam terminar de tecer.
Assim, à mesma hora, a escolha recaíu de entre os três sobre um, e só um fio foi cortado como a mão do irmão mais novo foi trespassada por um cântaro subitamente quebrado, precisamente na veia jugular que vem directa do coração. O irmão do meio sentiu um destroço a entrar dentro do olho direito depois de uma mina rebentar demasiado perto dele. E o mais velho foi prender um dos pés no lodo do rio e, quando tentava libertar-se, a corrente das águas veio demonstrar-lhe que ninguém estava seguro num rio, nem mesmo o melhor nadador, nem mesmo o homem mais forte que encontrara dias de trabalho, de dificuldades e de fome como ele próprio sentira. E fora ele o escolhido pelas parcas que, como sempre, fizeram o trabalho do qual nenhum espírito-carne irá conseguir escapar, desaparecendo então o irmão mais velho nas águas em que ele tanto confiava..


Ao meu pai, que foi um dos dois irmãos que sobreviveram e que tem a marca daquele dia em que os espíritos quiseram levar os últimos três rapazes vivos de uma família de sete que restavam de 14. A marca é o olho que já não tem e "foi uma sorte tremenda", disseram os médicos, "ter escapado com vida".

segunda-feira, março 07, 2005

Faltou-me a qualia das profundezas
Puras
De ti mesmo
E sei o que soçobrou
Internamente
Mas é só na pele que encontramos uma marca
Do abandono
Que com dedicação mordisca o instinto

sexta-feira, março 04, 2005

Menina de trapos

Estava debaixo dos cobertores e sentira o corpo adormecido pela má circulação mas não me importava porque estava confortável e o meio dia tocava no meu despertador há já meia hora mas nunca fui pessoa de deitar-me cedo nem de acordar a horas respeitáveis como os meus pais sempre disseram que isso existia isso existia perguntava eu todos os dias em o sol começava a descer do seu zénite acho eu mas sempre gostava mais de estar acordada à noite e o animal nocturno em que eu me tinha transformado era mais um reflexo do medo que tinha dos outros que andavam por aí enquanto a luz ainda existia do que de hábitos incontornáveis além disso tinha medo dos meus próprios pensamentos dos sentimentos que despertavam quando deviam adormecer no emaranhado que era a minha cama por fazer e apetecia-me estar aqui mais um pouco não dar nas vistas nem sair de casa e ouvia a máquina de costura da minha vizinha do lado a trabalhar pois ela é costureira e ainda me recordo do vestido que ela me fez aos 4 anos e também fez um igual para a minha irmã que é 8 anos mais velha do que eu e que o detestava por ser igual ao meu igual não mas tinha o mesmo corte e cor mas era maior do que o meu porque ela tinha 8 anos a mais o que a fazia maior do que eu era na altura e é engraçado porque agora sou maior do que ela mas eu queria sempre usar aquele vestido era tão bonito aquele vestido tão colorido aquele trapo que depois se transformou em vestido de boneca porque cresci e os vestidos bonitos deixaram de servir-me


E eu também já não sou menina de trapos

quinta-feira, março 03, 2005

Didn´t Sleep Last Night..

terça-feira, março 01, 2005

Estou aqui e não estou sou eu e não sou quem és

Travei um pouco para pensar noutras coisas que não aqui e fui surpreendido(a) com a seguinte reflexão ou conclusão de que isto não é um diário mas um reservatório de ideias perdidas e omitidas que nunca cheguei a amadurecer como qualquer cliché entediado que necessitasse de ser entrosado no resto de espírito que ainda me resta da ausência das noites de sonhos bem dormidos e também isto não é o meu quarto ou a janela por onde me perco ou então será mesmo mas consigo encontrar-me sempre porque estas não são as minhas ideias e nem tenho pretensões em que se transformem em tal escrevo apenas somente para brincar com as palavras jogar às escondidas com elas e produzir frases do tamanho de elásticos para me divertir ainda mais e faço-o sim por um gozo pessoal e por ser este um dos poucos sítios onde me é possível relacionar o divertido com o fingir dentro de situações amavelmente repetidas e criadas propositadamente para isso mesmo a ocasião faz o ladrão dizem por aí e decorrida uma vida inteira ainda que curta ou comprida conforme a perspectiva de quem conhece a vida de quem se encalha nestas vertentes inúteis sabe que homem ou mulher vampiro ou velha criança ou ser assexuado e até anjos com expressões agressivas não importa o papel que adopto sabe que o que importa aqui é o que é possível apreender uma vez integrado(a) na imagem que se escolhe desempenhar desta vez e não fazer algo de útil porque não pretendo nem aspiro a deixar uma mensagem para a prosperidade que subordine mentes estranhas uma vez que apenas desejo a Liberdade a minha e a tua

Gosto de fingir indeterminados caminhos depois quando não sei o que encontro ali vou lá ter possivelmente porque não tenho outro desejo do que conhecer o que não entendo e abraçar o mundo que não existe excepto na minha máquina orgânica pensante apenas aí