quarta-feira, março 09, 2005

A Hora do Lobo

Eram três vezes uma hora dentro de uma madrugada bem entrada. Era a hora do lobo e, como todos sabiam, era a hora em que os espíritos desciam sobre aquela que havia sido a antiga morada e por onde todos tinham passado e, nessa altura, escolhiam quem iria ser o próximo futuro apenas espírito...e apenas espírito porque até então era carne e espírito e depois passaria a ser como um deles.
Naquela hora escolheram então três irmãos. Os únicos rapazes de uma família de 14 dos quais já tinham sido transformados em espíritos metade deles e, agora os invisíveis queriam trazer consigo três dos sete que restavam... todos à mesma hora... mas que estaríam em sítios diferentes por força das circunstâncias das próprias vidas, uma de cada um.
Assim, fizeram um plano tridimensional conforme o espaço que dividia a Terra em terços, conforme os sítios onde se encontravam.
Um ía caminhando para se aproximar de uma fonte para encher o cântaro para matar a sede dos lá de casa, pois cachopo como era não tinha outra obrigação. Outro estava na guerra do Ultramar preparando-se uma vez mais para cumprir o dever que lhe fora incumbido, o dever supremo de proteger o seu país e, se tivesse de ser, teria até de morrer pela pátria, diziam-lhe embora sem muita convicção (pois cada um tinha os seus pensamentos e as suas próprias ideias sobre o sentido da guerra que não era a deles). Um último lembrava-se de ir nadar porque gostava sempre de ir orgulhando-se de ser o melhor de entre os moços que as aldeias perto da sua e que a sua onde tinha crescido ainda resguardavam.
Apenas as três irmãs parcas intercederam pelos três irmãos. Mas os espíritos pediam por um novo companheiro e as parcas é que teriam essa tarefa de escolher o fio de vida de entre os três que iriam terminar de tecer.
Assim, à mesma hora, a escolha recaíu de entre os três sobre um, e só um fio foi cortado como a mão do irmão mais novo foi trespassada por um cântaro subitamente quebrado, precisamente na veia jugular que vem directa do coração. O irmão do meio sentiu um destroço a entrar dentro do olho direito depois de uma mina rebentar demasiado perto dele. E o mais velho foi prender um dos pés no lodo do rio e, quando tentava libertar-se, a corrente das águas veio demonstrar-lhe que ninguém estava seguro num rio, nem mesmo o melhor nadador, nem mesmo o homem mais forte que encontrara dias de trabalho, de dificuldades e de fome como ele próprio sentira. E fora ele o escolhido pelas parcas que, como sempre, fizeram o trabalho do qual nenhum espírito-carne irá conseguir escapar, desaparecendo então o irmão mais velho nas águas em que ele tanto confiava..


Ao meu pai, que foi um dos dois irmãos que sobreviveram e que tem a marca daquele dia em que os espíritos quiseram levar os últimos três rapazes vivos de uma família de sete que restavam de 14. A marca é o olho que já não tem e "foi uma sorte tremenda", disseram os médicos, "ter escapado com vida".

3 Comments:

Anonymous Anónimo said...

hey.. ixo é verdadi??

max tá um bokadinho komplexa a exkrita da historia...

patinha

11:49 da tarde  
Blogger BlankPage said...

xim eh verdadi...mas eu bem tento tornar as histórias mais simples mas num konxigo...ainda por xima a exkrever às 4 da manhã...

1:15 da tarde  
Blogger Andre_Ferreira said...

Adorei como escreveste a história, e que história! Está mesmo bem escrita, adorei.
Beijinhos

11:57 da tarde  

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